sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Ditadura militar brasileira: uma reflexão

O golpe civil-militar desfechado em 1º de abril de 1964 inaugurou um dos períodos sangrentos e violentos de nossa história. Longos 21 anos para que as instituições políticas brasileiras fossem redemocratizadas, ainda assim tendo que engolir a derrota do movimento pelas diretas e o dissabor da anistia negociada, por um partido de “oposição consentida” responsável pelo fenômeno do terrorismo de Estado contra o qual se mobilizaram diferentes segmentos da sociedade como: intelectuais, artistas, ligas camponesas, o movimento operário, estudantil, a guerrilha urbana e tantos outros atores sociais.

A esse período, permanências históricas desvelam-se incrustadas nas mentalidades, na cultura, nas instituições e práticas políticas, feridas ainda abertas diante de um processo inconclusivo da luta pelo direito à memória, à verdade e à justiça, a reivindicação pela abertura dos arquivos da ditadura militar, a busca pelos desaparecidos, os traumas e marcas deixadas nos corpos e nas mentes daqueles que sobreviveram, as perdas irreparáveis dos que tombaram, a violência policial, a vigência ainda de práticas de tortura levadas a cabo por agentes do Estado, a reinvenção dos esquadrões da morte, a criminalização de movimentos sociais, entre tantos outros malefícios deixados pela ditadura.
Cabe ressaltar que distante de criar uma dicotomia entre o “bem”, civil, e o “mal”, militar, é sempre bom termo lembrar o período autoritário, como suporte ancora das elites nacionais e de setores das classes médias e populares, é alertar para o fato de que a ruptura da democracia é causada, por vezes, por aqueles que alegam lutar em sua defesa. Não por acaso, que setores das Forças Armadas e da sociedade ainda denominam o golpe de 1964 como “revolução”, que teria impedido de alguma forma a tomada do Estado pelo comunismo e o seu alinhamento ao socialismo subversivo.
O golpe ditatorial de 64 foi macabro, sinistro e de longa duração. O transcurso de seus 50 anos exige dessa nova geração um acerto de contas com o passado, para que se estabeleça a verdade, a justiça e a memória dos que foram brutalmente assassinados, perseguidos, exilados e torturados. Em nome dos que tiveram os direitos políticos, civis, sindicais e sociais cassados, também multidões de trabalhadores que sofreram o desemprego, o confisco, o arrocho salarial e os ritmos deprimentes do trabalho.
Tudo a favor da riqueza e do poder que, através dos altos oficiais militares, impuseram a dependência crescente ao grande capital mundial e jogaram o país em um endividamento externo sem precedentes que deu início à sequência da “década perdida”, dos anos 1980. Todavia, precisamos ir além, pois são evidentes as mazelas e heranças da ditadura militar até os dias atuais.
Nesse início de 2014, radicaliza-se a repressão policial contra os segmentos de trabalhadores, da população pobre, do movimento social. O monumental aparato repressivo que se ergue prol da Copa, completa o pacote de seus negócios e repressão as manifestações populares, com leis de exceção e criminalização aprovadas em diversos níveis legislativos, nos servem de alerta.
Monta-se esse aparato repressivo por governo que, outrora, se dizia dos trabalhadores. Forças policiais e militares ocupam, como se fosse um território inimigo, regiões urbanas, ficando pra trás o sangue de populares e trabalhadores, executados por policiais ensandecidos pela retórica de “guerra civil” e a impunidade de que gozam.
Que estranho país é o Brasil, que para a imposição da nova ordem democrático-autoritária, incute-se o medo à população, servindo-se da retórica da luta contra o terrorismo. Só uma pergunta: há terroristas contra civis entre nós, com terríveis armas químicas? Pasmem, quando vemos na televisão um vídeo mostrando uma pessoa sendo arrastada pelas ruas por um camburão da PM, após ter sido morta por esses mesmos policiais, uma luz vermelha deveria ficar sempre acesa.
Cinquenta anos depois do golpe e isto ainda ocorre, em especial nas periferias, favelas e comunidades das grandes cidades, onde a polícia tem licença para matar. A ordem militar burguesa segue seu ritmo amordaçando a população, com o literal monopólio da grande mídia, que se impôs desde seus primeiros momentos. Situação que todos os governos pós-1985, sem exceção, sancionaram e fortaleceram, infelizmente, a censura e a insidiosa desinformação da população. As heranças do regime militar estão mais do que nunca ativos na sociedade, de fato conquistamos o direito de voto, de organização, manifestação e expressão, porém é profundo o DNA violento e repressor ainda existente do Estado brasileiro.
As necessidades e direitos da população foram transformados em negócio, ou seja objetiva o lucro, que materializa em serviços inacessíveis e desqualificados. Direitos sociais e sindicais expropriados pela ordem militar, por exigência do capital, até então não devolvidos. Mesmo sob um governo que se imaginava “progressista”, monta-se um autêntico Estado de Exceção penal.
Para sermos coerentes com a história e a memória da luta contra a ditadura militar, é imperioso que bandeiras democráticas, políticas e sociais tenham relevância na pauta de todos os movimentos populares. Que não fiquem impunes os torturadores e mandantes dos crimes da ditadura, ainda vivos. Que se liquide com o monopólio do capital sobre os grandes meios de informação construídos e impulsionados pela ordem militar. Que se impulsionem a segurança, a saúde, a educação pública de qualidade. Que sejam abolidas todas as homenagens públicas que ainda se mantêm àqueles criminais como: nomes de ruas, avenidas, colégios etc.
Enquanto, a Comissão da Verdade instalada pelo Governo Federal vem caminhando para encerrar seus trabalhos, após dois anos de pesquisas e investigações que buscam elucidar alguns aspectos obscuros da ditadura, movimentos sociais e grupos organizados fazem intervenções artísticas em diversas cidades, renomeando praças, ruas, avenidas e pontes com nomes de desaparecidos e mortos pela repressão no lugar daqueles militares, policiais e civis apoiadores do aparato sociopolítico que cerceou a liberdade e a democracia nesse país.
Enfim, a sociedade brasileira necessita romper às heranças malditas do golpe de 64, que ainda contaminam nossas instituições. Creio ser este, o verdadeiro sentido de lembrarmos desta data. Assim, espera-se que esse texto permita ao público olhar para o período de governo autoritário vivido pelo Brasil entre 1964 e 1985, como um exercício de suma importância para a manutenção da democracia que reerguemos após estes 21 anos, à custa de centenas de vidas perdidas, destruídas, de famílias desfeitas e destroçadas.
(*) Ney Iared Reynaldo, doutor em História da América, docente dos cursos de História e Ciências Econômicas/ICHS/CUR/UFMT

Questões:
1) Comente as principais características da Ditadura Militar Brasileira;
2) Pesquisa e explique qual a função da comissão da verdade.
3) Explique por que a ditadura militar brasileira foi implantada a partir de uma associação da classe burguesa, de parte da classe média, de parte da igreja católica e das forças militares.


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